Sunday Setembro 8, 2024
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ADENDA: O PROGRAMA DE JUSTIÇA DO MPLA

Das 88 páginas que compõem o programa do MPLA, apenas duas são dedicadas à justiça. Não se percebe como pode ser tão débil a atenção dedicada a uma área que o governo declarou prioritária. Sem um plano sério e profundo, a justiça permanecerá no domínio da arbitrariedade, e o País não poderá alcançar os direitos humanos nem o tão almejado ambiente favorável aos negócios.

Afinal há um programa de justiça do MPLA – estava era escondido na gaveta de algum sábio.

O certo é que, depois de publicarmos no Maka Angola o artigo acerca da ausência de medidas para a justiça no documento de apresentação do programa do MPLA, fomos informados de que essas medidas existiam e estavam no programa, embora não constassem do longo sumário de 58 páginas que tinha sido apresentado ao público.

Não deixa de ser bizarro que uma súmula bastante desenvolvida do programa do MPLA omita os aspectos referentes à justiça, precisamente um dos temas centrais do mandato de João Lourenço. O partido do governo continua refém de uma certa forma de comunicar, característica das repúblicas socialistas nos anos 1980: um discurso empastelado, burocrático, lento e pouco flexível.

O programa para a justiça do MPLA, que entretanto viu luz, está bem estruturado, abrangendo temas como a garantia dos direitos humanos segundo os padrões internacionais, o fortalecimento da independência do Ministério Público, a criação de um ambiente de negócios estável e convidativo, e a promoção da modernização, da celeridade e da aproximação às populações.

Contudo, no essencial, as propostas para a justiça são um conjunto de ideias gerais ou melhor, dizendo, de intenções beatíficas, sem a necessária concretização nem um elenco de medidas específicas que permitam alcançar os objectivos enumerados.

Os direitos humanos, sendo símbolos proclamatórios, são, sobretudo, o resultado das acções nos e dos tribunais. Para que os direitos humanos sejam efectivamente garantidos, é preciso começar pela sensibilização das forças da ordem e segurança, para que os respeitem incondicionalmente,  e pelo sequente funcionamento dos tribunais.

A independência das magistraturas também não é um objectivo que possa ser alcançado através mais palavras ou proclamações.

Na verdade, embora isso possa ser injusto para alguns casos individuais, a verdadeira independência judicial só começará a ser garantida depois de uma renovação geracional dos próprios magistrados. Possivelmente, terá de existir um amplo movimento de jubilações, com vista ao rejuvenescimento de magistrados já formados segundo os cânones da independência e da imparcialidade, e não de acordo com as teorias marxistas ou socialistas do direito, que o apresentam como um instrumento do poder do Estado.

Acreditamos que não existirá real independência das magistraturas sem uma reciclagem dos tribunais superiores, substituindo os seus membros e alterando os seus modos de funcionamento.

É evidente que o partido do governo tem de apresentar algo mais do que aquilo que consta do programa: umas meras duas páginas de um total de 88.

Na realidade, espera-se que seja avançada uma nova bitola de comprometimento com a justiça que garanta a sua despartidarização e imparcialidade. É neste pressuposto que depois se poderá falar de garantia de direitos humanos, de ambiente de negócios favorável ou de acesso universal à justiça.

A novela em torno da suposta transacção, com alguns membros da família Santos, do funeral do patriarca por uma qualquer imunidade chocou fortemente todo o espírito jurídico. Não se sabe se estas negociações existiram efectivamente e em que é que consistiram, mas a opinião pública ficou com a impressão (errada?) de que as autoridades estariam dispostas a abdicar dos preceitos básicos do Estado de direito em troca de um funeral.

O problema que se coloca não é exactamente se tal negociação aconteceu ou não, mas o facto de muitos a acharem credível, demonstrando que a imagem da justiça está longe de congregar a unanimidade nacional.

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