DOENTES COM ELEFANTÍASE SEM MEDICAÇÃO
Mateus Francisco, de 65 anos, é um destes doentes. Residente no bairro Tiro aos Pratos, arredores da cidade de Ndalatando, padece de elefantíase, desde os 30 anos, quando começou a sentir os primeiros sintomas.
Natural do Golungo-Alto, Rosa Mateus, outra portadora de elefantíase, conta que os primeiros sintomas da doença começaram a surgir em 1987. Na altura, disse, vivia com o esposo. “No princípio, sentia picadas nas duas pernas. Decidi fazer alguns tratamentos médicos para solucionar o problema, mas notei, com o tempo, que não estava a surtir efeito. As duas pernas começaram a inflamar. Às vezes ficavam rugosas”, destacou.
Depois de passar por vários hospitais e clínicas do país em busca de soluções, confessa ter perdido um pouco a fé. “A doença só piora a cada dia. Sinto dores nos pés que me impossibilitam de andar, assim como muito cansaço. Algumas vezes tenho fortes dores de cabeça e tonturas”, lamentou.
Antes, contou, recebia medicamentos do Centro de Controlo das Doenças Tropicais Negligenciadas (DTN), em Ndalatando, mas há um ano que não recebo qualquer fármaco, devido à falta destes na Direcção de Saúde.
Devido à falta de tratamento e medicamentos, Rosa Mateus disse que tem tido muitas complicações, principalmente às noites. “São um inferno. Tenho constantes e fortes dores nos joelhos e nas pernas, mesmo massageando com analgésicos”.
Cansada e aflita com a situação, espera que as autoridades sanitárias ajudem a resolver o problema da falta de fármacos, para poder atenuar parte do sofrimento.
Outro portador desta patologia é António Alfredo Flor, de 59 anos, residente num dos bairros da periferia de Ndalatando, a quem a doença afectou o membro superior esquerdo há 21 anos.
Desmobilizado das Forças Armadas Angolanas, revela que a enfermidade começou em 1984, na altura ainda na frente de combate. “Sofri um ferimento de bala, que nunca mais curou. Com o passar do tempo a perna começou a tomar tamanho irregular e a pele viscosa”.
António Alfredo Flor informou que fazia tratamento e recebia os medicamentos no Hospital Central de Ndalatando, mas teve de parar porque os medicamentos deixaram de chegar na província. “Somos muitos nesta condição de desamparados e sem meios para a cura ou ao menos aliviar o sofrimento”, criticou.
Por conta da doença e do complexo de inferioridade causado pela patologia, António Alfredo vive, apenas, do dinheiro que ganha como reformado das Forças Armadas Angolanas. “É um valor muito ínfimo, que não dá para quase nada. Estou impossibilitado de fazer outro trabalho, por causa ds doença”.
Quando os primeiros sintomas surgiram, referiu, antes de se tornarem muito acentuados, ainda conseguia fazer pequenos negócios. “Mas abandonei por vergonha, pela forma como estava a perna”.
Separado da mulher e dos filhos, hoje vive de favores num dos cómodos na casa de um parente, por falta de meios para ter habitação própria.
Isabel Faustino João Simão, de 59 anos, moradora do bairro Vieta, em Ndalatando, é outra enferme. A padecer de elefantíase há mais de 30 anos, revela que nos últimos anos vive numa desgraça.
Sem medicamento para travar a actual progressão da enfermidade, a doente, natural do Golungo-Alto, conta que há mais de um ano não consegue andar. “Apenas fico em casa”, lamentou, além de acrescentar que teve de abandonar os trabalhos do campo. “Faço o que posso para sustentar a família. Mas não tem sido o suficiente. Já fui várias vezes ao hospital em busca de medicamentos, mas nunca têm. Dizem que dependem de Luanda”.
Causas e tratamento
A filariose linfática (elefantíase) é uma doença parasitária crónica, considerada uma das maiores causas mundiais de incapacidades permanentes ou de longo prazo.
É causada pelo verme nematoide “wuchereria bancrofti” e transmitida pela picada do mosquito culex quinquefasciatus (pernilongo ou muriçoca), de um infectado com larvas do parasita. A doença tem cura na fase inicial, desde que tratada com medicamentos capazes de matar o verme. Também podem ser usados analgésicos, além de técnicas que melhoram a drenagem do corpo, como o aumento do consumo de água e o uso de meias de compressão, assim como a aplicação de gelo na zona afectada.
Oito novos casos surgiram nos últimos seis meses
Os dados do Departamento de Saúde Pública do Cuanza-Norte apontam que foram registados, nos últimos seis meses, oito novos casos de elefantíase. Com este número passam a ser, no total, 18 doentes registados pelas autoridades sanitárias locais com esta patologia.
O responsável pelo Departamento de Saúde Pública da província confirmou, também, a falta dos fármacos para o tratamento da elefantíase, há aproximadamente um ano. “Os que haviam nos armazéns venceram a data de caducidade e foram enviados de volta para Luanda”, contou.
Francisco António Manuel adiantou, ainda, que a carência de fármacos já foi relatada às autoridades centrais e vai ser solucionado o mais rápido possível. Os doentes com a enfermidade, referiu, são ambulatórios e aparecem uma vez ou outra. “Por essa razão os medicamentos acabam por estragar”.
O médico afirmou que além dos pacientes registados, o Departamento de Saúde tem conhecimento que existem outros a padecerem da enfermidade, mas preferem furtar-se das consultas e fazer tratamento caseiro, ao invés de procurarem um especialista.
Os municípios de Cazengo, Cambambe, Golungo-Alto e Ngonguembo são os que mais casos relatam, com base nos dados em posse do Departamento de Saúde Pública do Cuanza-Norte.
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